Trabalhar no Brasil - Entrevista com o Engenheiro António Ferrão
António Ferrão é português, tem 31 anos, e é engenheiro civil. Trabalha no Brasil desde Novembro de 2011 e deu uma entrevista ao Engenharia e Construção onde se abordaram diversos assuntos relacionados com a experiência de ser um engenheiro civil português a trabalhar no Brasil, tais como o processo de selecção, a legislação, os salários, o método de trabalho, etc.
Não perca de seguida a entrevista que António Ferrão deu ao Engenharia e Construção.
As obras onde passei têm 280 apartamentos em 2/4 torres de 28/14 pavimentos. Chegamos a ter 300 a 500 pessoas no estaleiro. Para tal as equipas de obra têm normalmente 2 a 5 engenheiros, 4 a 10 estagiários, mestres, encarregados, encarregados administrativos, etc.
Essa foi uma surpresa agradável, poder ter ajuda no campo que me liberta para fazer um trabalho de controlo e planeamento mais detalhado. O sistema SAP é o software adoptado pelas maiores empresas para o controlo financeiro da obra.
Os processos construtivos são diferentes, particularmente ao nível da concepção da hidráulica, da execução da eléctrica, e da inexistência de exigências térmicas ou acústicas, apenas para citar os casos mais óbvios. Devido à dimensão das construções, os brasileiros desenvolveram soluções standard simples, mecanicamente reproduzidas, mesmo a nível arquitectónico, a padronização é a regra.
Enfim, passados os primeiros meses de adaptação, o dia-a-dia não é muito diferente, resolver problemas, atrasos, empresas que não cumprem prazos, qualidade, fornecimentos que não chegam, enfim, o costume.
Importa fazer uma última consideração sobre a cultura brasileira, o trato das pessoas, a forma de falar, de pedir, de exigir, enfim, requere habituação. Não é um povo directo, sincero, embora seja aberto e muito afável, é importante ter cuidado até saber em quem confiar.
Não perca de seguida a entrevista que António Ferrão deu ao Engenharia e Construção.
Em que empresa trabalha?
Trabalho numa das maiores construtoras/incorporadoras a operar no mercado brasileiro.Como foi realizada a sua contratação?
Fui contratado ainda em Portugal depois de responder a um anúncio num jornal. A contratação e o processo do visto foi pacífico, embora moroso.E o processo de selecção foi complicado?
O processo de selecção e recrutamento foi conduzido entre uma empresa de recrutamento e os Recursos Humanos próprios da empresa. Fiz um total de 5 entrevistas, telefónicas e via skype, desde os Recursos Humanos até ao Director-geral da empresa. Foi analisado o CV, em particular o tipo e dimensão das obras realizadas. Importa deixar claro que o meu caso é uma excepção. Em geral os candidatos têm de vir ou estar já no Brasil, sob pena de as empresas não darem seguimento. Importa ainda sublinhar que não há uma cultura de contratar estrangeiros, nem de haver gente interessada em vir trabalhar para cá. E como é um processo que envolve custos elevados, eles procuram muito saber das motivações da pessoa e até que ponto não vai desistir ao fim de algum tempo.Os salários no Brasil são melhores que em Portugal?
Os salários são de facto atractivos, uma média de 2 a 3 vezes o oferecido em Portugal, mas importa fazer as contas todas. O custo de vida no Brasil não é inferior ao de Portugal, pelo contrário, facilmente se gasta o dobro com as despesas normais do dia-a-dia, particularmente nas grandes cidades. Não há também o hábito de disponibilizar carro/portátil/alojamento/via verde. Um ponto que me apanhou de surpresa foi a desvalorização cambial, creio ter perdido cerca de 25% do salário desde que aceitei vir até agora. E vendo o que se está a passar por aqui, a tendência deve ser para o Real continuar a desvalorizar.A atribuição de vistos e o reconhecimento profissional, são um problema real para os engenheiros portugueses que procuram trabalho no Brasil?
Dentro da nova comunidade de portugueses chegados ao Brasil nos últimos 2 anos, temos sentido um crescente apertar das restrições à atribuição de vistos. E quanto ao reconhecimento de diplomas, o protocolo do CREA/CONFEA com a OE não avançou, por manifesta decisão política brasileira. Compreende-se, mas lamenta-se naturalmente. Desisti de fazer o reconhecimento da minha licenciatura pelos custos envolvidos, sem garantia de aprovação, num processo de 1 a 2 anos, também porque não me foi exigido por parte da empresa.Como descreve a experiência de trabalhar no Brasil?
Trabalhar em construção no Brasil é um desafio e uma oportunidade para nós trabalharmos em obras de uma dimensão que raramente se encontra em Portugal.As obras onde passei têm 280 apartamentos em 2/4 torres de 28/14 pavimentos. Chegamos a ter 300 a 500 pessoas no estaleiro. Para tal as equipas de obra têm normalmente 2 a 5 engenheiros, 4 a 10 estagiários, mestres, encarregados, encarregados administrativos, etc.
Essa foi uma surpresa agradável, poder ter ajuda no campo que me liberta para fazer um trabalho de controlo e planeamento mais detalhado. O sistema SAP é o software adoptado pelas maiores empresas para o controlo financeiro da obra.
Os processos construtivos são diferentes, particularmente ao nível da concepção da hidráulica, da execução da eléctrica, e da inexistência de exigências térmicas ou acústicas, apenas para citar os casos mais óbvios. Devido à dimensão das construções, os brasileiros desenvolveram soluções standard simples, mecanicamente reproduzidas, mesmo a nível arquitectónico, a padronização é a regra.
Há menos exigência na construção brasileira em relação à portuguesa?
O primeiro choque é de facto a menor exigência de conforto e segurança dos regulamentos, mas aos poucos compreende-se que essa é também uma evolução que se vai dar com o tempo, à medida que a sociedade vai adquirindo maior poder de compra e portanto, exigindo mais e melhor qualidade e conforto.É complicada a adaptação à legislação brasileira?
A legislação brasileira, particularmente a trabalhista, é diferente da que estamos habituados (aqui o trabalhador é muito protegido e é preciso ter alguns cuidados com isso, pois os empreiteiros gerais têm muito mais responsabilidades comparativamente a Portugal). O mesmo se verifica na fiscalidade, os diversos impostos ISS, INSS, PIS, SUFRAMA, IRPJ, CSLL, CONFINF, etc., o próprio tratamento das facturas, os prazos de pagamento (15 a 20 dias), os protestos, avisos de cartório, acções no SERASA. Aqui é impensável que uma empresa tenha pagamentos sucessivos em atraso ou fechar acordos a 60, 90, 120 dias.Enfim, passados os primeiros meses de adaptação, o dia-a-dia não é muito diferente, resolver problemas, atrasos, empresas que não cumprem prazos, qualidade, fornecimentos que não chegam, enfim, o costume.
Recomendaria o Brasil às pessoas que estão a ler esta entrevista?
Continuo a achar que o Brasil é um óptimo destino para os engenheiros portugueses que estejam dispostos a lutar por ultrapassar as dificuldades que referi. A qualidade de vida é boa, há oportunidades de crescimento, há volume de trabalho, a adaptação acaba por ser fácil e há muitos portugueses que ajudam a uma fácil integração.Importa fazer uma última consideração sobre a cultura brasileira, o trato das pessoas, a forma de falar, de pedir, de exigir, enfim, requere habituação. Não é um povo directo, sincero, embora seja aberto e muito afável, é importante ter cuidado até saber em quem confiar.
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2 Comentários:
"Importa fazer uma última consideração sobre a cultura brasileira, o trato das pessoas, a forma de falar, de pedir, de exigir, enfim, requere habituação. Não é um povo directo, sincero,"
Como assim não é um povo direto e sincero????
Quantos brasileiros o dignissimo acima conheceu???
Será que esta pessoa conheceu os 200 milhoes de habitantes de nosso país para generalizar todos?
Pois eu sou brasileira, direta, sincera ???
Será que sou a unica no pais!!!!!!!!
Realmente foi infeliz no comentario e relatou uma ou outra sia propria experiencia. Eu sou lusobrasileiro direto e sincero e as pessoas deste tipo e o oposto existem nos dois paises
, alias em muitos outros onde ja estive tanto a trabalho como nao.
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